Aos Senhores Presidentes da Argentina, Bolívia, Brasil, Equador, Paraguai, Uruguai, Venezuela,
Por um Banco do Sul orientado para uma matriz soberana, solidária, sustentável e integradora para o desenvolvimento do continente.
Por segunda vez, nos dirigimos aos senhores para expressar a enorme expectativa que existe em nossos povos pela iniciativa da criação do Banco do Sul. Anima-nos, também a resposta positiva de novos países da América do Sul, que manifestaram seu desejo de participar nessa iniciativa.
Os assinantes, somos redes, organizações e movimentos sociais, sindicatos e acadêmicas/os que vimos lutando contra o flagelo da dívida pública ilegítima e das políticas e práticas perversas das instituições financeiras internacionais e do atual sistema de comércio mundial. Estamos convencidas/os de que a decisão tomada de criar o Banco do Sul pode representar um enorme passo e uma oportunidade não somente para a América do Sul, mas para a América Latina e Caribe, e também para outras regiões do Hemisfério Sul.
Vimos de uma história recente de luta contra as ditaduras em quase todo o continente. Isto explica nosso empenho em abrir e instituir novos espaços de participação e de democracia direta. No entanto, a forma pouco transparente e não participativa como vêm se desenvolvendo as negociações para a criação do Banco do Sul, sem debate público e sem consulta às nossas sociedades, pode indicar que estamos frente a algo que pode repetir o que já existe.
Estamos convictos de que uma nova entidade financeira Sul-Sul deve orientar-se para superar tanto as experiências negativas de abertura econômica -com a seqüela de sempre mais endividamento e drenagem de capitais-, desregulação e privatização do patrimônio público e dos serviços básicos sofridos pela região, bem como dos já amplamente conhecidos comportamentos não-democráticos, não transparentes, regressivos e desacreditados dos organismos multilaterais, como o Banco Mundial, o CAF, o BID e o FMI. Nossa história recente tem mostrado que suas opções de política econômica e sócio-ambiental, impostas aos nossos governos através de condicionantes têm resultado em descapitalização e desindustrialização das economias da região, aprisionando-as ao modelo agro-mineral-exportador, que freia seu desenvolvimento e aprofunda a situação subalterna às economias do Norte, as ineqüidades sociais, os danos ecológicos e as dívidas ‘eternas’ -financeira, histórica, social, cultural, ecológica.
Conhecendo a importância de que os países comprometidos até agora com a criação do Banco do Sul cheguem a um acordo sobre temas-chave relacionados com sua natureza e objetivos, sua estrutura financeira e operativa, cremos essencial propor-lhes as seguintes questões, que expressam as aspirações de amplos setores das sociedades de nossos países, de acordo com a manifesta expressão de seus principais agentes sociais consultados:
1. Que o Banco do Sul se oriente a promover uma nova matriz de desenvolvimento, cujos valores fundamentais sejam a soberania de nossos povos sobre seu território e seu próprio desenvolvimento; a autodeterminação responsável de nossas políticas econômicas e sócio-ambientais; a solidariedade, a sustentabilidade e a justiça ecológica; que o Banco, o desenvolvimento econômico e tecnológico sejam concebidos como meios para o objetivo superior que é o desenvolvimento humano e social;
2. Que a ação do Banco do Sul seja determinada por metas concretas, como o pleno emprego com dignidade, a garantia da alimentação, a saúde e a habitação; a universalização da educação básica pública e gratuita; a redistribuição da riqueza, superando ineqüidades, inclusive as de gênero e etnia; a redução das emissões de gases e a eliminação de seus impactos sobre as populações do continente e sobre os demais povos do Sul.
3. Que o Banco do Sul seja parte integral de uma nova arquitetura financeira latino-americana e caribenha, que inclua um Fundo do Sul com função de Banco Central Continental capaz de articular um grande sistema de pagamentos com a mais avançada plataforma telemática; capaz de ligar as políticas que promovem a estabilidade macroeconômica com as políticas de desenvolvimento e de redução das assimetrias estruturais; e contemple o desenvolvimento futuro de um sistema monetário comum a serviço de uma estratégia de fortalecimento de laços econômico-comerciais no interior da região, introduzindo intercâmbios com moedas nacionais e trabalhando pelo estabelecimento de uma moeda regional pelo menos para os intercâmbios intra-regionais. A construção de um espaço de soberania monetária e financeira supranacional requer dotar-se de muita flexibilidade local para evitar tentações sub-imperialistas e o triunfo da ortodoxia monetarista em certos aspectos, como na experiência européia recente.
4. Que o Banco do Sul sirva para recuperar valores relativos às dívidas histórica, social e ecológica, das quais nossos povos são acreedores. Que seus financiamentos busquem superar as assimetrias e desigualdades sociais e os danos ambientais que têm sido perpetuados há mais de cinco séculos no continente.
5. Que o Banco do Sul contemple a participação das organizações cidadãs e os movimentos sociais não somente na elaboração de sua arquitetura original, mas também na tomada de decisões financeiras e operacionais e no monitoramento da utilização dos fundos adjudicados.
6. Que o Banco do Sul exerça sua direção de forma igualitária entre os países membros, institucionalizado e mantendo o princípio igualitário de "um sócio, um voto", em todos seus níveis de decisão colegiada e aspire a canalizar os recursos de poupança da própria região.
7. Que as carteiras de capital do Banco do Sul sejam proporcionais à capacidade das economias de seus países membros; que outras fontes de capitalização do Banco do Sul incluam parte das reservas internacionais e empréstimos dos países membros, impostos comuns e doações. Devem ser excluídos os recursos financeiros das atuais instituições financeiras multilaterais e de Estados que perpetraram o saqueio de nosso continente. Que estes dispositivos do Banco do Sul permitam o aumento crescente da aplicação das reservas dos países membros fora da área de influência do dólar e do euro e alentem o retorno dos capitais nacionais depositados no exterior.
8. Que o Banco do Sul esteja comprometido com a transparência na gestão, prestando contas públicas de seu funcionamento e atividade; submetendo-se à auditoria externa permanente de seus empréstimos e de seu funcionamento interno, com participação social.
9. Que, para que o Banco do Sul não seja "igual aos demais" pondere-se, de forma permanente, a qualidade, a austeridade e a eficiência da administração, proibindo qualquer privilégio de imunidade a seus funcionários; afirmada na mais plena transparência informativa em tempo real e o controle democrático e social da gestão. Para evitar gastos excessivos e desvios burocráticos, que se constitua um corpo de funcionárias/os compacto e, ao mesmo tempo, diversificado, eficiente, eficaz e administrativamente polivalente.
10. Que os empréstimos sejam destinados à promoção de uma integração regional genuinamente cooperativa, baseada em princípios como a subsidiaridade ativa, a proporcionalidade e a complementaridade, financiando projetos de investimentos públicos, atendendo ao desenvolvimento local autogestionário e impulsionando o intercâmbio comercial eqüitativo e solidário entre agricultores familiares, pequenos produtores, setor cooperativo e de economia social solidária, comunidades indígenas e tradicionais, organizações sócio-econômicas de mulheres, de pescadores, de trabalho, de identidade, etc.
11. Que o Banco do Sul adote como prioridade de investimento projetos que orientam a soberania alimentar e energética, investigação e desenvolvimento de tecnologias apropriadas ao desenvolvimento endógeno e sustentável da região, inclusive de softwares livres; a produção programada e complementar de medicamentos genéricos; a recuperação dos saberes ancestrais de nossos povos, sistematizando-os e aceitando-os como ciência agroecológica; a promoção da justiça ambiental; o fortalecimento dos serviços públicos; o apoio às vítimas de deslocamentos forçados; o fomento da comunicação e da cultura intra-regional; a criação de uma Universidade do Sul e um sistema de equivalência de diplomas em toda a região; e a infra-estrutura a partir de outras lógicas de organização do espaço, que municiem as comunidades com instrumentos para o desenvolvimento local autogestionário e solidário. Que o Banco do Sul não reproduza o modelo de financiamento das atuais instituições financeiras internacionais de construção de mega-obras destrutivas do meio-ambiente e da biodiversidade.
12. O Banco do Sul deve ser considerado como uma ferramenta essencial para custodiar e canalizar a poupança, rompendo os ciclos recorrentes de exação do esforço nacional e regional através de manobras e negociações com o endividamento e títulos públicos, o subsídio a grupos econômicos e financeiros privados privilegiados e/ou corruptos locais e internacionais e o aval permanente a movimentos especulativos de entrada e saída de capitais.
Entendemos tudo isso na mesma linha do que foi destacado pela Declaração Ministerial de Quito, de 3 de Maio passado, ao assinalar que: "Os povos deram a seus governos os mandatos para dotar a região de novos instrumentos de integração para o desenvolvimento que devem basear-se em esquemas democráticos, transparentes, participativos e responsáveis antes seus mandantes".
Preocupam-nos as sucessivas postergações da assinatura da ata de fundação, que podem indicar a existência de indefinições significativas. Esperamos que nas negociações para superar essas indefinições, as proposições desta Carta sejam levadas em consideração.
A atual conjuntura econômica e financeira regional e internacional continua favorável para dar passos concretos nesse sentido; porém, pode não ter continuidade. Confiamos que vocês aproveitarão esta possibilidade histórica para criar o que poderá tornar-se um verdadeiro Banco Solidário dos Povos do Sul.
Saudações.
Por um Banco do Sul orientado para uma matriz soberana, solidária, sustentável e integradora para o desenvolvimento do continente.
Por segunda vez, nos dirigimos aos senhores para expressar a enorme expectativa que existe em nossos povos pela iniciativa da criação do Banco do Sul. Anima-nos, também a resposta positiva de novos países da América do Sul, que manifestaram seu desejo de participar nessa iniciativa.
Os assinantes, somos redes, organizações e movimentos sociais, sindicatos e acadêmicas/os que vimos lutando contra o flagelo da dívida pública ilegítima e das políticas e práticas perversas das instituições financeiras internacionais e do atual sistema de comércio mundial. Estamos convencidas/os de que a decisão tomada de criar o Banco do Sul pode representar um enorme passo e uma oportunidade não somente para a América do Sul, mas para a América Latina e Caribe, e também para outras regiões do Hemisfério Sul.
Vimos de uma história recente de luta contra as ditaduras em quase todo o continente. Isto explica nosso empenho em abrir e instituir novos espaços de participação e de democracia direta. No entanto, a forma pouco transparente e não participativa como vêm se desenvolvendo as negociações para a criação do Banco do Sul, sem debate público e sem consulta às nossas sociedades, pode indicar que estamos frente a algo que pode repetir o que já existe.
Estamos convictos de que uma nova entidade financeira Sul-Sul deve orientar-se para superar tanto as experiências negativas de abertura econômica -com a seqüela de sempre mais endividamento e drenagem de capitais-, desregulação e privatização do patrimônio público e dos serviços básicos sofridos pela região, bem como dos já amplamente conhecidos comportamentos não-democráticos, não transparentes, regressivos e desacreditados dos organismos multilaterais, como o Banco Mundial, o CAF, o BID e o FMI. Nossa história recente tem mostrado que suas opções de política econômica e sócio-ambiental, impostas aos nossos governos através de condicionantes têm resultado em descapitalização e desindustrialização das economias da região, aprisionando-as ao modelo agro-mineral-exportador, que freia seu desenvolvimento e aprofunda a situação subalterna às economias do Norte, as ineqüidades sociais, os danos ecológicos e as dívidas ‘eternas’ -financeira, histórica, social, cultural, ecológica.
Conhecendo a importância de que os países comprometidos até agora com a criação do Banco do Sul cheguem a um acordo sobre temas-chave relacionados com sua natureza e objetivos, sua estrutura financeira e operativa, cremos essencial propor-lhes as seguintes questões, que expressam as aspirações de amplos setores das sociedades de nossos países, de acordo com a manifesta expressão de seus principais agentes sociais consultados:
1. Que o Banco do Sul se oriente a promover uma nova matriz de desenvolvimento, cujos valores fundamentais sejam a soberania de nossos povos sobre seu território e seu próprio desenvolvimento; a autodeterminação responsável de nossas políticas econômicas e sócio-ambientais; a solidariedade, a sustentabilidade e a justiça ecológica; que o Banco, o desenvolvimento econômico e tecnológico sejam concebidos como meios para o objetivo superior que é o desenvolvimento humano e social;
2. Que a ação do Banco do Sul seja determinada por metas concretas, como o pleno emprego com dignidade, a garantia da alimentação, a saúde e a habitação; a universalização da educação básica pública e gratuita; a redistribuição da riqueza, superando ineqüidades, inclusive as de gênero e etnia; a redução das emissões de gases e a eliminação de seus impactos sobre as populações do continente e sobre os demais povos do Sul.
3. Que o Banco do Sul seja parte integral de uma nova arquitetura financeira latino-americana e caribenha, que inclua um Fundo do Sul com função de Banco Central Continental capaz de articular um grande sistema de pagamentos com a mais avançada plataforma telemática; capaz de ligar as políticas que promovem a estabilidade macroeconômica com as políticas de desenvolvimento e de redução das assimetrias estruturais; e contemple o desenvolvimento futuro de um sistema monetário comum a serviço de uma estratégia de fortalecimento de laços econômico-comerciais no interior da região, introduzindo intercâmbios com moedas nacionais e trabalhando pelo estabelecimento de uma moeda regional pelo menos para os intercâmbios intra-regionais. A construção de um espaço de soberania monetária e financeira supranacional requer dotar-se de muita flexibilidade local para evitar tentações sub-imperialistas e o triunfo da ortodoxia monetarista em certos aspectos, como na experiência européia recente.
4. Que o Banco do Sul sirva para recuperar valores relativos às dívidas histórica, social e ecológica, das quais nossos povos são acreedores. Que seus financiamentos busquem superar as assimetrias e desigualdades sociais e os danos ambientais que têm sido perpetuados há mais de cinco séculos no continente.
5. Que o Banco do Sul contemple a participação das organizações cidadãs e os movimentos sociais não somente na elaboração de sua arquitetura original, mas também na tomada de decisões financeiras e operacionais e no monitoramento da utilização dos fundos adjudicados.
6. Que o Banco do Sul exerça sua direção de forma igualitária entre os países membros, institucionalizado e mantendo o princípio igualitário de "um sócio, um voto", em todos seus níveis de decisão colegiada e aspire a canalizar os recursos de poupança da própria região.
7. Que as carteiras de capital do Banco do Sul sejam proporcionais à capacidade das economias de seus países membros; que outras fontes de capitalização do Banco do Sul incluam parte das reservas internacionais e empréstimos dos países membros, impostos comuns e doações. Devem ser excluídos os recursos financeiros das atuais instituições financeiras multilaterais e de Estados que perpetraram o saqueio de nosso continente. Que estes dispositivos do Banco do Sul permitam o aumento crescente da aplicação das reservas dos países membros fora da área de influência do dólar e do euro e alentem o retorno dos capitais nacionais depositados no exterior.
8. Que o Banco do Sul esteja comprometido com a transparência na gestão, prestando contas públicas de seu funcionamento e atividade; submetendo-se à auditoria externa permanente de seus empréstimos e de seu funcionamento interno, com participação social.
9. Que, para que o Banco do Sul não seja "igual aos demais" pondere-se, de forma permanente, a qualidade, a austeridade e a eficiência da administração, proibindo qualquer privilégio de imunidade a seus funcionários; afirmada na mais plena transparência informativa em tempo real e o controle democrático e social da gestão. Para evitar gastos excessivos e desvios burocráticos, que se constitua um corpo de funcionárias/os compacto e, ao mesmo tempo, diversificado, eficiente, eficaz e administrativamente polivalente.
10. Que os empréstimos sejam destinados à promoção de uma integração regional genuinamente cooperativa, baseada em princípios como a subsidiaridade ativa, a proporcionalidade e a complementaridade, financiando projetos de investimentos públicos, atendendo ao desenvolvimento local autogestionário e impulsionando o intercâmbio comercial eqüitativo e solidário entre agricultores familiares, pequenos produtores, setor cooperativo e de economia social solidária, comunidades indígenas e tradicionais, organizações sócio-econômicas de mulheres, de pescadores, de trabalho, de identidade, etc.
11. Que o Banco do Sul adote como prioridade de investimento projetos que orientam a soberania alimentar e energética, investigação e desenvolvimento de tecnologias apropriadas ao desenvolvimento endógeno e sustentável da região, inclusive de softwares livres; a produção programada e complementar de medicamentos genéricos; a recuperação dos saberes ancestrais de nossos povos, sistematizando-os e aceitando-os como ciência agroecológica; a promoção da justiça ambiental; o fortalecimento dos serviços públicos; o apoio às vítimas de deslocamentos forçados; o fomento da comunicação e da cultura intra-regional; a criação de uma Universidade do Sul e um sistema de equivalência de diplomas em toda a região; e a infra-estrutura a partir de outras lógicas de organização do espaço, que municiem as comunidades com instrumentos para o desenvolvimento local autogestionário e solidário. Que o Banco do Sul não reproduza o modelo de financiamento das atuais instituições financeiras internacionais de construção de mega-obras destrutivas do meio-ambiente e da biodiversidade.
12. O Banco do Sul deve ser considerado como uma ferramenta essencial para custodiar e canalizar a poupança, rompendo os ciclos recorrentes de exação do esforço nacional e regional através de manobras e negociações com o endividamento e títulos públicos, o subsídio a grupos econômicos e financeiros privados privilegiados e/ou corruptos locais e internacionais e o aval permanente a movimentos especulativos de entrada e saída de capitais.
Entendemos tudo isso na mesma linha do que foi destacado pela Declaração Ministerial de Quito, de 3 de Maio passado, ao assinalar que: "Os povos deram a seus governos os mandatos para dotar a região de novos instrumentos de integração para o desenvolvimento que devem basear-se em esquemas democráticos, transparentes, participativos e responsáveis antes seus mandantes".
Preocupam-nos as sucessivas postergações da assinatura da ata de fundação, que podem indicar a existência de indefinições significativas. Esperamos que nas negociações para superar essas indefinições, as proposições desta Carta sejam levadas em consideração.
A atual conjuntura econômica e financeira regional e internacional continua favorável para dar passos concretos nesse sentido; porém, pode não ter continuidade. Confiamos que vocês aproveitarão esta possibilidade histórica para criar o que poderá tornar-se um verdadeiro Banco Solidário dos Povos do Sul.
Saudações.
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